[Terra Morta RPG] Capítulo 12 - Matthew




– Tô com uma sensação estranha – Vini comentou enquanto caminhavam. – É como se algo ruim estivesse pra acontecer, sei lá.
            – Paranóia sua – Matt sorriu. – Agora anda logo, ou vai se atrasar para a aula. Um estudante exemplar como você não pode deixar isso acontecer.
            Dito aquilo, Vini lhe mostrou o dedo do meio.
            – Tá aqui a resposta do seu estudante exemplar – ambos riram. – Te vejo mais tarde no ensaio.
            Assim que se despediram, Matt continuou a descer a rua. Eles dois eram membros de uma mesma banda havia cerca de dois anos, mas se conheciam desde muito antes disso. Sempre se deram bem um com o outro. “Praticamente irmãos”, costumavam afirmar.
            Mas então um grito, perto dali, o tirou de seus devaneios. Correu os olhos pela rua em busca da origem do som, e o que viu fez seu sangue gelar: Estirada no chão, uma senhora gritava e se debatia enquanto um homem, debruçado sobre ela, desferia socos violentos em seu rosto, grunhindo feito um animal enraivecido.
Viu o sangue esguichar quando o agressor enterrou os dentes no pescoço da idosa e puxou, arrancando um naco de carne. Seus gritos se transformaram em gemidos gorgolejantes enquanto se afogava com o próprio sangue, e logo ela parou de lutar para se defender.
Matt pensou em correr em auxílio, mas parou de chofre ao ver o sujeito levantar os olhos e fixá-los em si. Sua bocarra se escancarou mais uma vez, anunciando a investida que não demorou a chegar.
Agindo por instinto, Matt se virou e saiu em disparada.
Correu, correu e correu.


Abriu os olhos, sobressaltado.
Recostado na banca de legumes, olhou ao redor, lembrando-se do pesadelo do qual acabara de despertar. Não, não um pesadelo. Uma lembrança. Achava que nunca se esqueceria do dia em que tudo aquilo começou.
Ouviu o som de passos e se virou para encarar Nicholas.
– Você ta legal? – ele perguntou. Era alto, de cabelos claros e ondulados a lhe descer até pouco acima dos ombros.
– Tive um pesadelo – explicou.
O havia encontrado quando invadiu o açougue do mercado, há algumas horas. O lugar fedia terrivelmente quando entrou; as carnes apodreciam penduradas por ganchos de ferro, balançando para lá e para cá enquanto o sangue escorria lentamente, gotejando e manchando o piso de azulejos.
Havia uma segunda porta, do outro lado da sala. Ao atravessá-la, qual não sua surpresa ao encontrar o homem debruçado sobre um cadáver, a faca cravada até metade do pescoço do inimigo vencido.
– Me chamo Nicholas – havia se apresentado quando voltaram para os corredores no interior do mercado. – Mas pode me chamar de Nick.
Segundo ele, havia entrado ali através de uma porta nos fundos, a qual dava acesso a um beco usado como depósito de lixo pelos antigos funcionários do mercado, minutos antes de se encontrarem.
Nick comia de um pacote de bolachas quando se sentou ao seu lado. Ofereceu, e Matt não se fez de rogado: encheu a mão e levou à boca, mastigando lentamente enquanto pensava.
Olhou ao redor; o mercado não era muito grande mas, até onde sabia, era seguro. Não havia explorado o segundo andar, ainda, mas a idéia de permanecer ali era tentadora demais para ser deixada de lado.  Havia mantimentos suficientes para se manter por um bom tempo, mas primeiro...
– Quando é que subiremos para o segundo andar? – Nick quis saber, como que lendo seus pensamentos. Haviam discutido a respeito, mais cedo.
– Estava pensando nisso. Acho que quanto antes formos, melhor.
– Que tal agora?
– Agora?
– É.


Cada um trazia consigo um longo e afiado espeto de churrasco, preparados para perfurar qualquer filho da mãe que pudesse estar se escondendo em alguma daquelas salas. Ali ficavam as salas da secretaria, gerência, os banheiros e, segundo uma plaqueta, o refeitório, no fim de um corredor pelo qual haviam passado.
Com cautela, Matt girou a maçaneta da primeira porta, a secretaria, e a abriu lentamente. Do lado de dentro: sangue. Diversas folhas de papel, caderno e agendas cobriam o chão de maneira desorganizada, tingidos de vermelho pelo sangue de algum dos antigos funcionários  do mercado.
– Vazia – sussurrou.
Encontraram a segunda porta entreaberta. A sala da gerência estava em igual estado de destruição e, como na anterior, não havia nenhum zumbi li.
“Zumbi”. Chamá-los dessa maneira fez com que Matt sorrisse amargamente, lembrando-se dos tempos em que aquelas coisas só existiam nos filmes. Talvez a vida houvesse se transformado num filme, pensou. Um maldito filme de terror do qual nenhum personagem sairia vivo no final.
No banheiro feminino encontraram o primeiro cadáver: uma moça de no máximo trinta anos. Tinha os cabelos duros e quebradiços, empapados por grossas camadas de sangue já seco. Sua garganta já não existia, e um dos peitos, desnudo, havia sido arrancado a dentadas.
– Mas que merda – praguejou, fechando novamente a porta ao sair.
Havia muito sangue, já seco, no banheiro masculino, mas nenhum corpo ou inimigo à espreita.
– Resta o refeitório – Nick comentou ao seu lado. – Caso estejam lá, em maior numero do que possamos enfrentar, o que faremos?
– Corremos – não era óbvio? – Enchi as mochilas com mantimentos antes de subirmos, e as deixei recostadas no primeiro lance de escadas. Se precisarmos fugir, as apanhamos e vamos para o açougue, escapando por onde você entrou.
Nick assentiu e, juntos, encaminharam-se para o corredor inexplorado.
A porta do refeitório estava aberta, mas levou um longo momento de hesitação até que Matt conseguisse a coragem necessária para espiar o lado de dentro. Quando o fez, os viu. Esbarravam uns nos outros enquanto caminhavam a esmo por todo o refeitório, tão silenciosos quanto um cadáver, outrora, deveria ser, mas mais vivos e perigosos do que jamais poderia ter imaginado antes de tudo aquilo começar.
Só se deu conta de ter olhado por tempo demais quando ouviu o primeiro rosnado, seguido de outro, e mais um. Então sentiu os doze pares de olhos pousando sobre si. Quando se virou, encontrou um Nick apreensivo, o espeto de metal levantado na altura dos olhos, aguardando instruções.
– Corre – sussurrou, já voltando a suar frio.
Ouviu-os gritar, famintos, logo atrás de si, e o som dos passos rápidos e leves acompanhando os seus, enquanto partia em disparada pelo corredor, tão depressa quanto suas pernas podiam suportar.
Em momento algum olhou para trás.





O texto acima não tem qualquer vínculo com a história original de Terra Morta e nem foi escrito por Tiago Toy. É uma adaptação do RPG mestrado no Orkut por Luan Matheus, escrita pelo próprio.

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