[Terra Morta RPG] Capítulo 2 - Edmar



Confinado em seu próprio apartamento, tudo se tornara monótono após um tempo. Eletricidade tornara-se algo tão raro quanto a comida que, após todos aqueles dias, estava no fim. Sua única fonte de luz era uma vela, a ultima, bruxuleando sobre a mesa em meio à escuridão.


Edmar suspirou.


Sabia que não poderia permanecer ali por muito mais tempo, mas a ideia de deixar a segurança de seu apartamento o amedrontava tanto quanto os monstros que povoavam o restante do prédio. Mas teria que sair, uma hora ou outra, e aquele talvez fosse o melhor momento para isso. Quem sabe a escuridão o ocultasse o suficiente para que deixasse o lugar sem ser percebido, embora houvesse riscos. Muitos.

Lutando contra seus próprios receios, apanhou a chave do próprio carro sobre a mesa, a mochila ao lado da mesma, e recolheu todos os mantimentos dos quais ainda dispunha: uma garrafa d’água, já na metade, e alguns pães mofados que havia guardado para aquela ocasião. Como arma, sua velha faca de cozinha, presa ao cinto, e uma barra de ferro enferrujada.

Manteve o ouvido rente à porta por alguns minutos, apenas para se certificar de que nenhum daqueles monstros estivesse do lado de fora. Sem ouvir nenhum som senão a própria respiração, girou a maçaneta e saiu.


Viu algumas estrelas do outro lado da janela no corredor, como olhos vigilantes, espionando-o através do negrume do céu. Não havia lua, o que ajudava a proporcionar ainda mais sombras no decorrer do corredor.

Arriscou dar os primeiros passos em direção ao breu.

Estava no terceiro andar, e as escadas não ficavam muito longe. Seguiu em frente, com cautela, a barra de ferro erguida na altura dos olhos. Sabia que estavam ali, e não demorou para finalmente ouvir os desgraçados. Pareciam estar nos apartamentos vizinhos ao seu, o que o fez redobrar o cuidado enquanto avançava.

Seguia aos tropeços, sem conseguir enxergar muito além de alguns metros a sua frente. Quando enfim alcançou as escadas, a descida se mostrou ainda mais complicada do que imaginava. Os degraus estavam escorregadios. Sangue? Bem provável.

            O som dos infectados ficava cada vez mais distante conforme descia.

            Até que, num ato de descuido, tropeçou, e o primeiro urro fez-se ouvir no momento em que rolou escada abaixo. Sentiu o sangue escorrer, quente, por sua testa.

            Se esforçou para levantar e correr, ignorando a dor que lhe afligia cada parte do corpo. Havia sido descoberto, e não lhe restavam alternativas, agora, senão a fuga desesperada na qual acabara de engajar.

            Seguia impulsionado pelo grito encolerizado daquelas coisas que, a julgar pelos sons, desciam o primeiro lance de escadas, em seu encalço. Alcançar o segundo andar não lhe serviu de alívio, teria que sair dali o quanto antes, ou mais deles seriam atraídos e, então, estaria perdido.

            Torcia apenas para que, mediante aquela escuridão, os filhos da mãe enxergassem tão bem quanto ele. E foi assim que percorreu o corredor, às cegas. Podia ouvi-los logo atrás de si, embora não tivesse ideia de quantos eram. No mínimo três, a julgar pelos sons.

            Pensou em se esconder, mas essa não era mais uma opção. Tarde demais para qualquer alternativa senão continuar correndo. Suas pernas doíam, mas recusava-se a ceder estando assim tão perto da saída. Logo estaria livre ou, pelo menos, era o que esperava, até ouvir o primeiro grunhido vindo da escuridão para qual se dirigia.

            Edmar parou de chofre, tentando manter a calma e raciocinar tão rápido quanto lhe cabia. Estava encurralado, podia ouvi-los se aproximando, agora dos dois lados. Não tinha como escapar, a não ser que...

            – A janela! – disse para si mesmo.

            Não tinha nada a perder. Então olhou para o lado de fora por um milésimo de segundos e, sem pensar duas vezes, se jogou. Sentiu o vidro rasgar sua camiseta e lhe cortar a pele nos braços, e logo em seguida o impacto do próprio corpo contra o piso lá embaixo.

            Tudo escureceu.


            Acordou com os primeiros sinais da manhã.

            O céu, antes negro, tingia-se agora em tons cinzentos e nuvens ainda mais escuras.

            Sua cabeça latejava, assim como todo o resto de seu corpo. Com os braços manchados pelo próprio sangue nos locais onde o vidro cortara, lembrou-se de seu plano suicida. Havia escapado, afinal. Mas durante quanto tempo ficara desacordado?

            Com um pouco de esforço, Edmar se levantou e olhou ao redor. Estava ao lado da piscina do hotel, a essa altura preenchida com cadáveres e sangue. Aliás, havia sangue em toda parte; cadeiras, mesas, ou simplesmente o próprio piso.

            Sem perder tempo, apanhou sua velha barra de ferro e pôs-se a procurar por qualquer coisa útil em meio aos destroços, sem muito sucesso. Dirigiu-se então à saída, atento a qualquer sinal de inimigos. Se conseguisse chegar à garagem, poderia usar seu carro para fugir dali. Teria apenas de atravessar o salão principal e correr até as escadas que levavam ao subsolo.

            Assim que voltou para o interior do prédio, viu o primeiro deles. A camareira, sem uma das orelhas e parte da pele do rosto. Seu uniforme, antes branco, jazia agora coberto com o próprio sangue. Sem hesitar num só momento, ela investiu aos berros.

            – Ótimo – Edmar ironizou. – Já estava demorando.

            Mas não iria fugir dessa vez. Era apenas uma, poderia lidar com aquilo.

            Esperou que se aproximasse, e assim que adentrou o alcance de sua barra de ferro, desferiu o primeiro golpe, arremessando-a contra o chão. Mas ela era rápida, mais do que Edmar julgava ser possível, e não demorou a se levantar e atacar pela segunda vez.

            O segundo golpe acertou-lhe a cabeça, e ela foi novamente ao chão. E então Edmar desferiu o terceiro, quarto, quinto golpe, até que nada restasse além de uma plasta disforme onde antes houvera o crânio da camareira-monstro.

            Virou-se para seguir adiante, mas parou ao notar-se observado por mais quatro daquelas coisas, parados à porta de entrada do prédio. Seus rostos se enrugaram num grito encolerizado, e então avançaram, forçando Edmar a uma nova caçada.

            E ele correu. Podendo, dessa vez, enxergar onde pisava, avançou com mais segurança. Não demorou para que alcançasse as escadas e iniciasse a descida. Seus perseguidores fizeram o mesmo, tão rápidos quanto o próprio demônio. Sem perder tempo, enfiou a mão no bolço em busca das chaves do carro, sem cessar a corrida. Agradeceu a si mesmo por ter se lembrado de pegá-las antes de deixar o apartamento.

            Na garagem, a iluminação era precária. Mas não viu problemas em encontrar o próprio veículo em meio a tantos outros; estava exatamente onde estacionara há dias atrás.

No momento em que entrou, o alcançaram. Não mais quatro, porém nove deles, embora não fizesse ideia de onde os outros haviam vindo. Rodearam o automóvel numa questão de segundos, esmurrando os vidros na tentativa de alcançar sua caça. E mais e mais deles se aproximavam, esgueirando-se por detrás de destroços e outros carros, atraídos pelo som.

            – Hoje não, miseráveis – disse Edmar, e pisou fundo no acelerador.



O texto acima não tem qualquer vínculo com a história original de Terra Morta e nem foi escrito por Tiago Toy. É uma adaptação do RPG mestrado no Orkut por Luan Matheus, escrita pelo próprio.

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